E por falar no Protocolo brasileiro...


Olá, pessoal,

Ouvi dizer que tem gente que não ficou sabendo direito como se deu a mudança nos Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas para a doença de Gaucher. E o post de hoje é sobre isso. É um assunto denso, que precisa ser conhecido e discutido. Segue o link para o documento:
http://conitec.gov.br/images/Consultas/2017/Relatorio_PCDT_Gaucher_CP10_2017.pdf


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Mas, o que é um PCDT?

Segue a definição de um Procolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas (PCDT), segundo o seu próprio texto:

"Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas (PCDT) são documentos que visam a garantir o melhor cuidado de saúde possível diante do contexto brasileiro e dos recursos disponíveis no Sistema Único de Saúde. Podem ser utilizados como material educativo dirigido a profissionais de saúde, como auxílio administrativo aos gestores, como parâmetro de boas práticas assistenciais e como documento de garantia de direitos aos usuários do SUS. Os PCDT são os documentos oficiais do SUS para estabelecer os critérios para o diagnóstico de uma doença ou agravo à saúde; o tratamento preconizado incluindo medicamentos e demais tecnologias apropriadas; as posologias recomendadas; os cuidados com a segurança dos doentes; os mecanismos de controle clínico; e o acompanhamento e a verificação dos resultados terapêuticos a serem buscados pelos profissionais de saúde e gestores do SUS."

Então, vamos ao que interessa: o PCDT da doença de Gaucher, e seu histórico.

Em 2002, o Ministério da Saúde instituiu o primeiro PCDT para a doença de Gaucher, criando as normas e os centros de referência para o tratamento da doença no Brasil. Vale lembrar que, naquela época, o Protocolo só contava com uma opção de tratamento: a terapia de reposição enzimática com a Imiglucerase.
Deem uma olhada: http://www.sivs.org/images/stories/Portaria_SAS_MS_322_2002_2.pdf

2011 foi um ano bem difícil. Não houve alterações no PCDT, mas a Imiglucerase teve sua produção e fornecimento interrompidos por problemas de biocontaminação, ocorridos na fábrica da Genzyme. Isso causou problemas de  desabastecimento da droga no mundo todo. O Ministério da Saúde brasileiro tomou, então, uma decisão inédita, e resolveu substituir a Imiglucerase pela Taliglucerase alfa, um medicamento que ainda estava em fase de testes:
http://www.sivs.org/pt/publicacoes/379-a-doenca-de-gaucher-e-os-problemas-no-abastecimento-da-imiglucerase.html   ; para, posteriormente, fabricar esta mesma medicação no Brasil: https://www.bio.fiocruz.br/index.php/brasil-amplia-producao-de-medicamentos-biologicos

Tais mudanças, tão unilaterais e bruscas, pegaram pacientes, e toda a comunidade médica, de surpresa.

Em 2014 o PCDT da doença de Gaucher foi alterado para a inclusão de novos medicamentos de terapia de reposição enzimática (como a Velaglucerase alfa), e para a inclusão da Terapia de Redução do Substrato (com o Miglustate):
http://portalarquivos.saude.gov.br/images/pdf/2014/novembro/19/Publica----o-nov-2014-Doen--a-de-Gaucher.pdf

Em 2017, o Protocolo foi submetido a uma consulta pública, com vistas à sua alteração. A proposta era a de ampliar e modificar os critérios para a prescrição da TRE, mantendo-a como primeira linha de tratamento, mas colocando  a Taliglucerase alfa como a primeira opção, inclusive para uso pediátrico. O texto sofreu fortes críticas de adoecidos, familiares, associações de pacientes, e da própria comunidade médica:
http://conitec.gov.br/images/Consultas/Contribuicoes/2017/CP_CONITEC_10_2017_PCDT_para_Doen%C3%A7a_de_Gaucher.pdf

No entanto, aparentemente, todas as contribuições foram ignoradas, e o texto original foi aprovado, tal como foi apresentado à consulta:
http://conitec.gov.br/images/Consultas/2017/Relatorio_PCDT_Gaucher_CP10_2017.pdf

Uma pena, e um sinal de alerta, para todos os interessados no assunto. 



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(... pausa para o gatinho com o tapa ouvidos, que ninguém é de ferro!)

Até o presente momento, a Doença de Gaucher é a única, dentre todas as doenças do depósito lisossômico, contemplada com um Protocolo de Tratamento e um programa ministerial no Brasil. Sem dúvida, este é uma garantia que os adoecidos não podem prescindir. Porém, é preciso que as pessoas com Gaucher conheçam o Protocolo. 

A despeito de ele ser um documento oficial, nada é imutável nesta vida, não é mesmo? E a boa notícia é que, se ele foi construído (pensado, elaborado, e escrito) por alguém -que demonstra pouca, ou nenhuma interlocução com os pacientes de Gaucher, seus familiares e cuidadores- ele também pode ser desconstruído, através do conhecimento, da crítica e da mobilização, não é mesmo? E isso é assunto para os próximos posts.



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Comentários

  1. Só acho que parece haver um interesse muito grande por parte do governo em "empurrar goela abaixo" a Taliglucerase. Por que será? Quem seria beneficiado com isto?

    Enquanto for possível vou preferir a Imiglucerase, por já ser bastante utilizada (diferente daquela que até há pouco tempo ainda estava em teste), as reações adversas não são tantas e tanto é que até as gestantes podem tomá-lo.

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    1. Oi, Ronilson!
      De fato, é quase impossível compreender a insistência do governo com a Taliglucerase alfa. Infelizmente, falta ao governo, além de bom senso, muita transparência nesta questão. Mas, quero acreditar que as coisas estão mudando: a internet tem sido uma boa aliada para fomentar e tentar encontrar respostas para estas questões.
      Muito obrigada por seu comentário. Espero encontra-lo sempre por aqui.
      Um grande abraço!

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