Sobre as origens da Doença de Gaucher

Quem tem doença de Gaucher, ou estuda sobre o assunto, provavelmente já sabe, ou já ouviu alguém falar, que a doença de Gaucher é uma "doença de judeu". A maioria dos estudos (senão a sua quase totalidade) sobre a doença de Gaucher, seja ele de qualquer área, a descreve como sendo uma doença que acomete mais frequentemente pessoas de origem judaica. 

Epidemiologicamente falando, estima-se que a frequência da Doença de Gaucher na população mundial seja de 1 caso a cada 40.000 a 60.000 pessoas, e maior (1:400 a 1:800) entre os judeus ashkenazitas  (judeus estabelecidos, ou originários, do leste europeu, mas que vivem por todas as partes do mundo) (1). 

Dados históricos mostram a presença de uma alteração no gene responsável pela síntese de um tipo de enzima no interior das células desde antes do primeiro milênio (por volta de 800 d.C.) neste grupo étnico específico. Essa alteração seria a causa da Doença de Gaucher (2). Porém, não existem informações disponíveis e específicas sobre a prevalência deste traço étnico nos adoecidos brasileiros.

Na prática, o que será que estas informações querem dizer? Será que  toda pessoa que tem Gaucher tem antepassados judeus? Ou que é judeu e não sabe? Qual será a relevância desta informação para os adoecidos? E mais: que diferença isso faz?

Sempre considerei estas questões muito interessantes...e instigantes. Então, em minha tese de Doutorado, eu perguntei aos adoecidos que entrevistei:  "Você já ouviu falar que a Doença de Gaucher é uma doença de quem tem familiares judeus? O que isso significa para você?" 

As respostas que eu obtive foram as mais variadas e diversas possíveis. E embora a maioria dos entrevistados afirmasse conhecer esta informação, tendo-a ouvido principalmente dos médicos que os diagnosticaram, alguns nunca tinham ouvido sequer falar do assunto, e se disseram surpresos quando fiz esta pergunta. Mas todos, sem exceção, manifestaram muito interesse por esta informação, e curiosidade em saber mais sobre o assunto. Nenhum deles, no entanto, afirmou categoricamente que tinha parentes judeus. 

Por  conta de uma outra informação biomédica importante na doença de Gaucher -a de que ela é uma doença genética e hereditária- as narrativas que foram sendo construídas pelos entrevistados à pergunta que fiz sobre suas origens familiares eram tão interessantes, com detalhes tão ricos de suas histórias, que elas, por si só, mereceriam outro estudo. Eram histórias de viagens, de encontros de pessoas tão diferentes entre si, de amores proibidos, de portos e de terras distantes...tudo tão belo, tão íntimo e pessoal...É por este motivo que eu não me canso de agradecer às pessoas que entrevistei, e que me contaram as suas histórias. Minha vida ficou muito mais rica depois disso. 

Flat teamwork concept with people rowing
(Imagem: Freepik.com)

Você também ficou curioso? Quer saber mais sobre o assunto? 

Leia o meu livro "De onde veio esta doença? O que pensam os adoecidos sobre a gênese da doença de Gaucher", à venda em: https://clubedeautores.com.br/livro/de-onde-veio-esta-doenca#.XIgp-yhKjIU

Minha tese também tem achados muito interessantes, e merece uma olhada: http://repositorio.unicamp.br/handle/REPOSIP/322314 



(1) Grabowski GA. Gaucher disease: lessons from a decade of therapy. J Pediatr. [Internet] 2004 May [cited 2016 Out 10];144(5 Suppl):S15-9. Available from: < https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/15126979 > DOI:10.1016/j.jpeds.2004.01.050
(2) Diaz GA et alli. Gaucher disease: the origins of the Ashkenazi Jewish N370S and 84GG acid beta-glucosidase mutations. Am J Hum Genet. [Internet] 2000 Jun [cited 2016 Out 10];66(6):1821-32. Epub 2000 Apr 21. Available from: < https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/10777718 > DOI: 10.1086/30294

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